Acho que já havia passado o meio dia quando levantei. Como de costume, me perguntei qual dia da semana era: “terça, talvez?”, por sequência respondendo em voz alta o mesmo de sempre:
- Que se foda!
A minha bebedeira tinha diminuído um pouco, mas eu ainda fumava cigarros o suficiente para acordar atordoado, tonto e fedido. Eu pensava que fumava bastante só porque bebia demais; coisas que os outros nos dizem em dias de ressaca, isso nunca fez sentido. Sempre fumei demais mesmo. O cigarro era uma espécie de lábio que se atrelava ao meu nos momentos de solidão, um torpor desgraçado de poucos minutos que gostava de me usar também, me acordando no meio da noite na cama, no sofá, na rua ou de frente as igrejas; em qualquer hora e lugar lá ele estava: doce e amargo, um sútil e cinzento gosto de vingança contra minha natureza.
Acho que já fumei cem milhões de cigarros. Não sou daqueles que conta as butucas, os litros de gasolina ou o número de mulheres com quem se deitou. É uma alucinação tola criar uma média dos limites só pra ter um pouco mais de segurança. Se os cigarros estavam no fim era só comprar mais, caso a gasolina acabasse: ‘voilà’, tinha meu par de pernas pra terminar o caminho, e, quando as mulheres não liberavam o ‘dote’, eu usava minhas mãos pra terminar o ‘serviço’. No final das contas, a vida não me era tão complicada assim.
Mas, algumas exceções haviam surgido. Eu estava bebendo menos, como já disse, pois estava num novo barato que me deixava tranquilo e sem vontade de encher a cara ao me deparar com o calendário, afinal. Tinha conseguido, com uma amiga farmacêutica, uma quantidade significativa de metadona em comprimidos. Diziam, em algum lugar que não me recordo, de que essa droga superava até mesmo o uso da heroína, no quesito prazer e, como não sou fã de agulhas e de picadas nem de insetos, cai de cabeça nessa válvula de escape.
Nos primeiros dias de uso, era, realmente, um paraíso. Abatia-se sobre mim uma letargia quase mortal, só que controlável. Eu não sentia fome e nem vontade de sair arrumar encrenca com rabos de saia, parecia que tudo o que eu precisava estava na minha imaginação. E isso durou um bom tempo. De cinco em cinco miligramas eu não vi alguns meses se passarem, até o momento em que eu precisei de mais e não tive.
Sem boletas disponíveis, acho que, sem brincadeira, por algumas longas semanas eu senti as dores do parto em todo o corpo e devo ter suado feito um cavalo dos filmes de velho oeste. Reaprender a beber e a continuar minha vida sem aquele ‘orgasmo sintético’ demorou uma eternidade. Provavelmente, foi a versão mais ‘junk’ de mim que joguei no lixo do passado. Mas, como o tempo teima em rodopiar:
- Que se foda!
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